domingo, 29 de março de 2009

São as mesmas. As horas que vêm e as que vão.

São muitas as horas que podemos passar em transportes públicos todos os dias. Eu passo duas, uma para cada lado, há já quase dois anos. As caras são quase sempre as mesmas, com as mesmas horas e as mesmas maneiras mais ou menos inteligentes de passar o tempo. Dá-lo por perdido, apenas depende da nossa vontade.

No início, comecei por escrever. Pequenos rabiscos, desenhos e frases mais ou menos desconexas. Arranjei uma agenda nos primeiros meses, pequena, que me permitia manter actualizadas as poucas horas ocupadas pós-laborais que tinha.
Cansei-me depressa.

Passei a ler muito, livros e revistas, e tudo o que me ajuda ainda a ser sempre outra qualquer realidade. Tento que sejam pequenos, e leves, que façam com que seja mínimo o espaço ocupado na carteira.

Aprendi, entretanto, que conseguia dormir nas viagens e faço-o muito ainda, principalmente nos tempos em que o cansaço dos enche de tudo.

Comecei a tricotar, a fazer pequenas bolsas e trabalhos reduzidos com uma só agulha. Tal como os livros, tento sempre que ocupem o menor peso e espaço possível. Transporto-os sempre numa pequena bolsa com 2 ou 3 pequenos novelos de lã, outra pequena agulha e uma tesoura em miniatura para os remates finais.

Na maior parte do tempo, quando não tenho companhia, ouço ainda música. Quase sempre com o volume no máximo que me permita abafar todas as conversas e os ruídos. Com a falta de alternativas para o que não queremos ouvir, aprendi que qualquer som num elevado grau de decibéis permite que nos ouçamos a nós próprios em surdina.

Fui descobrindo com o tempo o prazer em observar quem entra quem sai como se me observasse a mim mesma. Centenas de caras e comportamentos. O cansaço, a euforia, as conversas sobre tantas vidas e os risos exagerados. Os olhares incómodos, os momentos de loucura, os choros escondidos atrás de óculos onde o sol não passa. Os sonos de bocas abertas e cabeças caídas. Os perdidos e encontrados atrás de livros e revistas, computadores, telemóveis e todo o tipo de gadgets. E principalmente, a analisar cuidadosamente todos os que vêem naquelas janelas a fuga para aquele momento.

2 comentários:

Venus as a boy disse...

Belíssimo texto! :)
Vamos todos aos "fujimori" (como eu lhes chamo)?!

Anónimo disse...

Gostaria eu nos meus tempos citadinos ter sido tão prendada:)

Mas oq quer q faças tornando-se objecto de partilha será certamente imprescindivel!

Gosto muito deste texto e do betão que o constroi e torna tão quotidiano e semelhante a comuns realidades*